Entrevista: Fernando Manuel Pinto, diretor de direitos esportivos do Grupo Globo
Foto: Divulgação/Grupo Globo |
Após a Globo assegurar contrato com o Palmeiras até 2024, o
novo modelo de divisão de receitas do futebol para a Série A do Brasileirão
está praticamente consolidado, restando apenas o Athletico Paranaense no PPV.
Com a nova divisão de cotas tendo cerca de 60% de receita
variável, os clubes precisarão ter ainda mais equilíbrio financeiro e união
para conseguirem, em 2024, renegociar o contrato. Em entrevista exclusiva Ao Portal
Máquina do Esporte, Fernando Manuel Pinto, diretor de direitos esportivos do
Grupo Globo, falou sobre o novo cenário do futebol brasileiro e disse que os
clubes precisam se unir para o desenvolvimento institucional e comercial do
futebol poder acontecer.
Máquina do Esporte: A conquista do acordo com os 20 clubes
para a Série A deste ano impacta de que forma o negócio do futebol para a
Globo?
Fernando Manuel: Para as telas da Rede Globo, SporTV,
Premiere, Globoesporte.com e no Cartola, agregar mais e mais clubes atende o
objetivo principal, que é proporcionar ao público e parceiros a melhor
experiência na oferta do futebol brasileiro. Ao incluir os jogos do Palmeiras
na Série A, sem dúvida obtivemos "Sinal Verde" para uma cobertura
ainda mais completa! Quanto ao relacionamento com o futebol, este acordo eleva
ainda mais a convicção do passo dado pela implementação do Novo Modelo de 2019
a 2024, a mais ampla negociação já promovida na Série A tanto em número de
temporadas cobertas, quanto no número de clubes que abrange. Ainda perseguimos
um entendimento com o Athletico Paranaense para o pay-per-view e o OTT, já que
atualmente só exibimos os jogos do clube na Rede Globo e no Globoesporte.com.
ME: O que muda na negociação com os clubes a partir do novo
modelo?
FM: Chegamos, agora, a 37 clubes parceiros no Novo Modelo
2019-24, que é aberto a todos os clubes de maneira uniforme, estabelecendo pela
primeira vez no país, com grande esforço e muita disciplina, um modelo
padronizado. Não é um cheque preestabelecido, mas sim um conjunto de fórmulas
que determinam a fatia do bolo de direitos da Série A a ser recebida por cada
um dos clubes.
ME: Ele limita mais o que pode ou não ser pago para as
equipes?
FM: Quando se estabelece modelos padronizados, é possível
lidar com algumas situações onde a própria consistência parece "jogar
contra". Mas esse conflito é na realidade aparente. Não se administra ou
desenvolve algo sem buscar determinados padrões, sem mirar maior equilíbrio e
práticas de meritocracia esportiva e comercial. Princípios são construtivos,
como pilares. Buscamos isso no novo modelo.
ME: Seria melhor ter uma entidade para negociar, como na Copa
do Brasil?
FM: Costumo dizer que cabe a quem vende direitos determinar
como vendê-los. Isso engloba não apenas aspectos como definir o momento da
venda do produto ou detalhamentos do mesmo, mas em tese, também, se venderá
coletiva ou individualmente. A quem compra, na realidade a todos que têm
interesse em comprar, resta avaliar o quadro que se apresenta e desenvolver uma
estratégia para alcançar objetivos, dentro de suas possibilidades. Assim, se
lida com o que se apresentar.
Nos últimos anos, grandes negociações se apresentaram
unificadas, como Copa do Brasil e Libertadores. Na Série A, o oposto: vale
lembrar que nos lançamos à negociação de maneira individualizada, tendo
inclusive determinados clubes já contratados aqui ou acolá, com a Turner, sob
outra formatação em determinada mídia, naquela ocasião. Todavia, as negociações
aqui resultaram num modelo coletivo, o que é excelente olhando o futuro. Vários
rios enfim correndo ao mesmo mar.
ME: Com base no que houve agora, é possível imaginar que
encontraremos uma união entre os clubes para debater o próximo contrato, em
2024?
FM: Creio que seja uma pergunta melhor dirigida aos clubes,
eles detém os direitos originalmente. Entendo, de qualquer forma, a
perplexidade pela situação brasileira quando olhamos o que ocorre mundo afora.
No final das contas, clubes de futebol profissional são entidades que tem
milhões de motivos para disputar e encrencar uns com os outros, mas existe um
propósito maior, gigantesco, que deveria
bastar para uni-los: o desenvolvimento institucional e comercial do Futebol a
partir do conjunto da obra. Aqui não me refiro apenas a contratos de direitos,
pois há muitas outras pautas de interesse comum dos clubes que também demandam
visão, abordagem coletiva, como relação com poder público e mercado
internacional, por exemplo. São diversos assuntos merecedores de atenção
estruturada pelos clubes, com viés coletivo, profissional e de longo prazo.
ME: A Globo poderia pagar mais aos clubes se não tivesse de
ser responsável também pela produção dos jogos?
FM: Não enxergo essa correlação. Obviamente, a produção dos
sinais dos jogos e de tudo o mais que cerca o futebol envolve grandes custos,
mas isso, na realidade, consiste em investimento incremental destinado a
transformar aquele ativo adquirido dos clubes, os direitos, no conteúdo final
levado ao público, contando não apenas o que acontece nas quatro linhas, nos 90
minutos, mas também as histórias do dia a dia do futebol.
ME: Como foi possível convencer os times de maior apelo
comercial que seria interessante para eles assumirem o risco do novo modelo de
divisão de receitas?
FM: Nossos clubes são todos de grande apelo: possuem marcas
com gigantesco envolvimento histórico e emocional com sua localidade e torcida,
independentemente da abrangência. As transformações promovidas pelo Novo Modelo
só foram possíveis por algo essencial: ambiente propício. Acima de tudo, o
olhar mais crítico e atento dos clubes, gerando um engajamento colaborativo e
sincero das partes envolvidas. Como em qualquer negociação, o resultado do Novo
Modelo da Série A não é obra apenas do Grupo Globo, mas sim do Futebol
Brasileiro também, pois diversos clubes contribuíram e muito para sua
formulação desde 2016 e ocorreram desdobramentos que foram se revelando
necessários.
E sempre faço questão de frisar nas discussões com os clubes
que o Novo Modelo jamais teve a pretensão de ser perfeito, seria impossível.
Miramos um grande passo. Se as transformações dependeram do ambiente e desafios
então verificados, os aprimoramentos dependerão do reconhecimento dos avanços
conquistados e, sobretudo, dos passos que ainda precisam ser dados. Essa é uma
agenda coletiva e das mais importantes para o Futebol Brasileiro.
ME: A conta do Campeonato Brasileiro é lucrativa para a
Globo?
FM: Talvez não seja o executivo mais competente para
responder essa questão. Como diriam os técnicos de futebol, tenho atuado mais
no último terço do campo, cuidando do relacionamento e da compra dos direitos.
Contudo, creio que isso possa ser encarado da seguinte forma: para qualquer
player e de qualquer setor, da mídia ao patrocínio. Uma propriedade como o
futebol acaba abraçada não apenas pelo seu potencial comercial, mas também pelo
valor estratégico para seus respectivos negócios, além do impacto social e
cultural que exerce no país. Olhando a situação específica da Globo, diria que
é notável e digno de reconhecimento o envolvimento, esforço e consequente
investimento feito no Futebol Brasileiro por décadas, algo que transcende a
aquisição de direitos, envolvendo a produção de horas e horas de conteúdo de
altíssima qualidade registrando e difundindo a Paixão Nacional para dezenas de
milhões de lares e olhares brasileiros.
Entrevista
concedida a Erich Beting/Portal Máquina do Esporte
Comentários
Postar um comentário