Mais um veterano dá adeus: Marido de Sandra Annenberg, Ernesto Paglia é demitido da Globo
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Imagem: Reprodução / Rede Globo |
A reportagem
teve acesso ao comunicado feito pelo diretor geral de Jornalismo da Globo, Ali
Kamel, aos funcionários. O chefão exaltou Paglia por seu sucesso e contribuição
para a empresa nos quase 44 anos em que ele integrou o time de jornalistas.
"Depois
de quase 44 anos, anuncio que Paglia encerra no dia 31/12 sua trajetória na
Globo. Termina o ciclo de um repórter brilhante, referência para todos nós. O
filho do Gerardo e da Haida; o pai do Bernardo, do Frederico e da Elisa; o
marido da Sandra; o Bochecha, como era chamado na infância, um colega gentil e
acolhedor. E deixará um legado irretocável", informou Kamel.
O
ex-funcionário agradeceu à emissora por permitir que ele "colecionasse um
repertório profissional de dar orgulho" e ao apoio nos 13 meses de home
office que fez durante o auge da pandemia de Covid-19. Aos 63 anos, ele afirmou
que ainda tem muito a oferecer como jornalista.
"Nesta
despedida da Globo, não posso deixar de agradecer às companheiras e
companheiros que tanto me ensinaram, jornalistas com quem compartilhei dias e
noites de trabalho, nas Redações de todos os programas para os quais
produzi", disse ele em nota.
Ainda há
muitas por contar. As novas tecnologias multiplicaram as telas. E acredito
ainda ter muito a oferecer como jornalista, ofício que me dá enorme orgulho.
Parafraseando um velho slogan, a gente se vê por aí.
Casado com
Sandra desde 1994, ele têm apenas uma filha com a jornalista, Elisa Annenberg Paglia,
de 19 anos. Paglia atuava como repórter especial para diferentes programas como
o Jornal Nacional e o Fantástico. Em novembro, participou do quadro Tem ou Não
Tem, no Caldeirão com Mion, ao lado da mulher.
Ernesto
Paglia começou sua carreira no Jornalismo no terceiro ano de faculdade, em
1979, como repórter na Rádio Jovem Pan. Na época, ele acabou demitido em menos
de três meses por participar de uma greve organizada pelo Sindicato dos
Jornalistas de São Paulo. No ano seguinte, foi contratado pela Globo também
como repórter.
Sua primeira
grande cobertura jornalística aconteceu em 1982, na Copa do Mundo na Espanha.
Ele ainda cobriu mais sete edições do Mundial de futebol e quatro Olimpíadas. O
jornalista se tornou correspondente internacional da Globo em 1986, em Londres,
função que exerceu até 2001 com uma pausa de 11 anos.
Paglia
esteve no conflito entre Irã e Iraque em 1989, e na Segunda Intifada Palestina
e invasão norte-americana ao Afeganistão, entre 2000 e 2001. Nos anos
seguintes, ele fez reportagens e apurações especiais para os programas
jornalísticos da Globo.
Confira abaixo o comunicado interno
na íntegra:
"Recém
terminada a Copa do Catar, pensei em começar este texto relembrando um episódio
ocorrido há quarenta anos em Madri.
A Itália
tinha conquistado o tricampeonato, eliminando, no caminho, a reverenciada
Seleção Brasileira de Zico, Sócrates [1954-2011], Júnior e Falcão, na chamada
Tragédia do Sarriá. A Squadra Azzurra de Paolo Rossi [1956-2020] começara a
competição desacreditada, tão criticada que os jogadores decidiram fazer voto
de silêncio, uma greve de entrevistas: eles se recusavam a falar com
jornalistas italianos.
Um jovem
repórter da TV Globo, fluente em italiano, tinha sido escalado para acompanhar
desde os primeiros treinos o time comandado pelo técnico Enzo Bearzot
[1927-2010]. Foi ganhando confiança e conseguindo furos que encheram de inveja
os colegas europeus. No dia 11 de julho, quando a Itália venceu a Alemanha e
levantou a taça do tri, nosso repórter foi interrompido, de forma rude, durante
uma entrevista com Bearzot. 'Somos italianos, fale conosco', disseram
cinegrafistas da Rai, com arrogância. Bearzot respondeu com um abraço e um
beijo no jornalista da Globo. 'È un bravo ragazzo'.
Aquele jovem
repórter era Ernesto Paglia, então cobrindo a primeira de oito Copas do Mundo.
Mesmo sendo, em suas próprias palavras, 'impermeável ao futebol', Paglia sabe
contar histórias, com texto refinado e generosidade. Esse talento o transformou
num dos nomes essenciais do telejornalismo brasileiro.
Filho de mãe
argentina e pai italiano, também jornalista, Paglia se formou na USP
[Universidade de São Paulo] e chegou à Globo em 1979, por indicação de Carlos
Monforte. O início foi no turno da madrugada, mas em pouco tempo, depois de
emplacar reportagens no Jornal Nacional, Paglia ganhou um quadro no Bom Dia São
Paulo. Batia à porta de personalidades bem cedo, montava o set e se preparava
para entrevistas ao vivo, durante o café da manhã.
Destacou-se
rapidamente. Participou de coberturas emblemáticas no início da década de 80:
greves do ABC, visita do Papa João Paulo 2º [1920-2005], Diretas Já. Convidado
para o Globo Repórter em 1983, Paglia levou prêmio internacional com um
programa, roteirizado por Fernando Gabeira, sobre o cacique Mario Juruna
[1943-2002], então o primeiro indígena eleito deputado federal.
Foi
correspondente em Londres duas vezes. A primeira delas, de 1986 a 1989. Numa
época de grandes transformações no cenário geopolítico, gravou com líderes
mundiais, como Gorbachev [1931-2022] e Margaret Thatcher [1925-2013].
Acrescentou ao currículo o jornalismo de guerra, com reportagens no Iraque,
durante o conflito sangrento contra o Irã.
Cobriu a
Segunda Intifada e a invasão americana ao Afeganistão. A prisão de Slobodan
Milosevic [1941-2006] e a libertação de Nelson Mandela [1918-2013]. A Rio-92 e
o avanço do desmatamento na Amazônia, em anos recentes. Nas últimas quatro
décadas, o público brasileiro se acostumou a ser bem informado por Ernesto
Paglia, sempre com inteligência e sensibilidade.
Viajou pelo Brasil
de ponta a ponta no quadro JN no Ar, concebido por mim e exibido durante as
eleições de 2010. Em busca do que de melhor e pior uma cidade podia oferecer,
os destinos eram definidos por sorteio, uma cidade diferente a cada dia, o que
impedia prefeitos e governadores de fazer maquiagens de última hora. E Paglia
cruzava o país de jatinho com a equipe, sem saber como seria a próxima
reportagem, o que iria encontrar. Às vezes, pegava uma turbulência e fazia
piada cantando 'Segura na mão de Deus'. A experiência no comando do quadro
virou livro, lançado em 2011.
A carreira
ofereceu a oportunidade de unir trabalho e paixões. Colecionador de carros
antigos, teve o privilégio de dirigir em Interlagos com Ayrton Senna
[1960-1994] no banco do carona. Fascinado por mergulho, viveu inúmeras
aventuras submarinas, mundo afora, e apresentou durante quatro anos o programa
Globo Mar [2010-2013], concebido por Humberto Pereira e dirigido por Terezoca e
Teresa Cavalleiro.
Paglia
passou por todos os telejornais e fez parte do time que lançou a Globonews, em
1996. Teve uma segunda temporada no Globo Repórter. Foi um dos 16 repórteres
escolhidos para falar dos 50 anos do jornalismo da Globo, na série do Jornal
Nacional exibida em 2015.
Nos últimos
dez anos, Paglia se dedicou ao Fantástico e esteve à frente de quadros como Vai
Fazer o Quê?, que promovia uma espécie de experimento social, testando a reação
de pessoas diante de situações de discriminação e injustiça. Entrevistou a
filipina Maria Ressa, vencedora do Prêmio Nobel da Paz, ano passado; foi à
Guatemala, na cobertura dos estragos causados pela erupção do Vulcão de Fogo,
que matou 200 pessoas em 2018 --para citar apenas alguns exemplos.
Depois de
quase 44 anos, anuncio com esse e-mail que Paglia encerra no dia 31/12 sua
trajetória na Globo. Termina o ciclo de um repórter brilhante, referência para
todos nós. O filho do Gerardo e da Haida; o pai do Bernardo, do Frederico e da
Elisa; o marido da Sandra; o Bochecha, como era chamado na infância, um colega
gentil e acolhedor. E deixará um legado irretocável.
Sua última reportagem no Fantástico foi exibida ontem, dia 25 de dezembro. Uma viagem que relembra outro grande acontecimento de 1982, o ano da Copa da Espanha: a Guerra das Malvinas (ou Falklands, para os britânicos), entre Argentina e Inglaterra.
Mas ainda
poderemos apreciar um pouco mais da maestria de Ernesto Paglia nas telas da
Globo. O bravo Ragazzo deixa pronto um Globo Repórter especial, parte das
comemorações de 50 anos do programa. E há em gestação um projeto de
documentário para o Globoplay.
Ao Paglia,
em meu nome e no da Globo, o nosso muito obrigado”.
Ali Kamel
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